segunda-feira, 16 de março de 2009

Sobre mesas e balões.

Eram pequenos os detalhes, mas já podia-se perceber nela, desde pequena a inquietude de sua alma.Não era como as outras crianças, não se contentava com as respostas vagas e imprecisas que a mãe lhe dava sobre as mais improváveis perguntas que lhe viam á mente quando parava por alguns minutos a contemplar as samambaias da varanda. Ela tinha fome do mundo e a mãe tentava prênde-la á mesa de madeira da cozinha, justo a cozinha seu lugar preferido, mobiliado por peças em madeira ( o que explica seu gosto, desde a muito tempo pelo que é rústico.) e lugar de suas experiências gastronômicas ( o que também sempre gostou de fazer, pois cozinhar era mais que brincadeira, sentia-se bruxa, alquimista e dona de sí, ao amassar as bananas na hora da merenda e juntar á elas tudo que achava nos armários), mas aquela grande mesa de madeira solitária no meio da cozinha, sempre a aterrorizava. A pequena criança de cachos dourados e olhos verdes se sentia cada vez menor, sob a magnitude e poder que emanavam daquele móvel , fazendo lembrar-lhe toda a autoridade da mãe. No primeiro dia de aula, já demonstrara seu gênio difícil e seu perfeccionismo, rasgara a pintura que havia feito, antes mesmo que a professora visse, achou que seu balão seria mal compreendido pelos colegas, que talvez veriam nele uma simples batata. Preferiu dar outro destino ao desenho. Os balões ficariam assim repousando até o momento que ela ( a ovelha negra da família) pudesse soltar as cordas do seu balão ( que ainda estavam amarradas á antiga mesa) e traçaria seu próprio destino. Como boa desorientada que sempre fora, levaria como bússula o seu coração, cansado de viajar os quatros mares, mares que percorria toda noite nos sonhos com seu príncipe (des)encantado( os anti-heróis das historinhas que lia) . Buscava sempre algo a mais, talvez aquilo que passava despercebido aos olhos das outras menininhas de sua idade que a olhavam chocadas após ouvirem de sua boca e cara de desprezo que: - menino loiro de olhos azuis não tem a menor graça! ( tampouco teriam seus cavalos brancos). Em meio as constantes tempestades e a falta de oxigênio que sentia em seus pulmões, resolveu que era hora de alçar vôos maiores. A bonequinha do papai agora cresceu, toma suas próprias decisões, cortou o cabelo, pintou as unhas de vermelho, tem no seu corpo as marcas da vida e faz das mesas, pistas de decolagem.
Da série:
todo escritor e desenhista deveria ter aulas de História Moderna.

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